sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

REPASSANDO...


Lula na fábula de Fedro

Otávio Sitônio Pinto

As novas gerações não leram Esopo, Fedro nem La Fontaine. Eles não constam mais do currículo ginasiano. A minha geração conheceu esses fabulistas no primeiro ano do ginásio, quando tínhamos dez anos. Lembro-me do primeiro texto: “Vulpes ad persona tragicam”. Acho que o título era mais ou menos assim. Sei que em Latim não tem mais ou menos, o idioma de Vergílio é famoso por sua exatidão. Mas é pedir muito à minha memória que se lembre da fábula de Fedro ipse litteris.

Tudo começou com o primeiro desses fabulosos. Esopo era um fabulista grego, Fedro foi o tradutor que levou os textos de Esopo para o Latim, La Fontaine traduziu Fedro para o Francês. Lembro-me de alguns textos de Fedro em Latim, o fabulista discorrendo sobre as peripécias dos bichos, dizia-se que para representar os figurões da corte. No nosso primeiro livro de Latim, a primeira lição era sobre “A raposa para a máscara de tragédia”.

Eu detestava Latim. Era preciso saber muita análise sintática (que se chamava também de análise lógica) para adentrar o texto latino, com suas palavras terminando de várias formas, conforme estivessem em algum dos diversos casos: nominativo, vocativo, genitivo, ablativo, dativo, acusativo, no singular ou plural, e até no neutro. Era pra fundir a cuca de um menino de dez anos.

Mas as fábulas eram muito interessantes. A raposa encontrou a máscara de tragédia, “et dixit: ó, quanta aparentia! Sed cerebrum non habet.” Presumo que o leitor entendeu. As palavras que precisam ser traduzidas são o verbo “habet”, de onde vem “haver”, e o conectivo “sed”, que quer dizer “mas”. Faço esses comentários porque o Douto Leitor deve ser jovem, enquanto eu já sou maior de setenta, do tempo de Fedro.

Um parêntese: Vossa Excelência está ouvindo essas marteladas? Vêm da obra de ampliação do meu passarinheiro, onde crio periquitos e hamburguesas, liberados pela legislação. Disse o polígrafo João Suassuna que os periquitos foram os últimos animais a serem domesticados. Eu queria saber das hamburguesas. Por que têm esse nome? O Doutor Google não sabe.

Voltando a Esopo: tinha aquela do cordeiro e do lobo, “Vulpes et agnus”. O cordeiro estava bebendo água no córrego, quando o lobo veio beber também. Mas o lobo tava a fim era de beber o sangue do cordeiro. Et dixit que o cordeiro baldeava a água que o lobo mau estava bebendo. Aí o cordeiro disse que não podia baldear a água do lobo, pois ele, o cordeiro, estava à jusante, do lado de baixo da correnteza, e o lobo à montante, do lado de cima.

- Então foi seu avô que baldeou minha água, seu cordeiro fdp! E o lobão matou o cordeirinho inocente, como fazem as pessoas humanas, tão perversas quanto os lobos. Matou e bebeu o sangue, e fez buchada com suas vísceras. Depois tirou o gosto com a água limpa do córrego.

Estou dizendo essas coisas porque acho uma semelhança com a Operação Lava Jato e suas investigações sobre os amigos de Lula da Silva. A Lava Jato quer porque quer que os amigos de Lula digam alguma coisa que incriminem o ex-presidente, mas Lula estava à jusante da História. Os caras da Lava Jato querem fazer buchada com as tripas de Lula, bebendo água no córrego do Ipiranga, nas margens plácidas do riacho da Independência.

Mas Lula estava à jusante, do lado de baixo, e os lobos do lado de cima, à montante.

- Se não foi você, foi sua mãe, ou seu avô, seu metalúrgico fdp!

Há quem não se conforme com o fato de Lula, um torneiro mecânico, ter sido presidente da república duas vezes. Acho os torneiros mecânicos muito capazes. Dia desses, Faísca fez uma peça de carro para mim, em aço inoxidável, copiando a peça original de plástico. A fábrica fez a peça de plástico para se quebrar, como se quebrou na porta da garagem do shópingue, atravancando o trânsito. E a concessionária só vendia o conjunto, trezentos e cinquenta reais. Faísca fez só a peça quebrada, por setenta, de aço inox! Não vai se quebrar nunca.

E se a Lava Jato não achar nada contra Lula & Dilma? Lula vai fazer uma peça de aço inox para tirar o Brasil do prego, na porta do shópingue. Torneiro é para essas coisas.

(Esta coluna sai terça, quinta e sábado)

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