Mercosul, Venezuela e luta de classes
(Nota Política do PCB)
A recente entrada da Venezuela no Mercosul – pedida, oficialmente, ainda em 2006, por aquele país – além de alterar profundamente a estrutura, o funcionamento e o potencial econômico do bloco, pode representar uma virada nas relações políticas e econômicas entre os países da América Latina e tem repercussões diretas na luta de classes.
O Mercosul foi criado, em 1991, com a assinatura do “Tratado de Assunção”. O Tratado foi assinado sob a influência da herança de governos ditatoriais recém findos nos países signatários e seu “entulho” autoritário, que incluía acordos assinados e não assinados que favoreceram a repressão e beneficiaram segmentos das respectivas burguesias, como no caso das terras de brasileiros no Paraguai. A criação do Mercosul se deu no início de uma década de fortíssima hegemonia neoliberal, refletindo, assim, as políticas de governo então predominantes.
Foi criado um mercado comum, para bens e serviços e, naquele ano, o comércio do Brasil com os demais membros do bloco alcançou a cifra de 4,5 bilhões de dólares, tendo atingido, em 2010, a casa de 39,2 bilhões (com superávit de 6 bilhões para o Brasil). O bloco mantém, ainda, como Estados Associados, desde 2004 – com direito a algumas regalias – o Chile, o Peru, a Bolívia, a Colômbia, o Equador e a Venezuela, esta agora como membro pleno.
Com a exceção de Brasil e Argentina, que apresentam alguma complementariedade nas estruturas produtivas e são de porte relativamente próximo – o PIB da Argentina equivale a pouco mais de 1/3 do PIB brasileiro –, as desproporções econômicas e sociais entre estes dois países, Uruguai e Paraguai são imensas. Some-se a este fator a falta de tradição em planejamento – interno e internacional –, nos planos econômico e social, as grandes diferenças nas leis, outras dificuldades e a história recente de grande instabilidade política no Paraguai.
Ganharam, com o Mercosul, as grandes empresas, que puderam especializar suas linhas de produção e ampliaram seus mercados e que puderam, no caso dos grupos brasileiros e argentinos, pagar salários aviltados com a entrada de muitos imigrantes uruguaios e paraguaios (e dos demais países vizinhos), obtendo, assim, maior exploração da força de trabalho. Ganhou a burguesia, cujos interesses estavam representados nos respectivos governos.
Por outro lado, com o tempo, houve um certo amadurecimento nas relações entre os membros do bloco, consolidou-se o Conselho do Mercado Comum, seu órgão superior, e outras instâncias administrativas. Muitas dificuldades foram superadas. Pode-se afirmar que a existência do Mercosul fortaleceu os países membros no campo da política internacional e, de certa forma, reduziu a vulnerabilidade das economias da região à crise e às oscilações das economias mais fortes do sistema, como a européia e a norteamericana.
A entrada da Venezuela, como declarou, recentemente, o presidente Mujica, do Uruguai, não se deu por motivações de governantes, mas sim por razões de Estado, em que pesem as diferenças significativas nas visões políticas presentes nos atuais governos. O Mercosul forma agora um bloco de quase 270 milhões de habitantes, com um PIB conjunto de cerca de 2,8 trilhões de dólares, capaz de enfrentar, em melhores condições, como um pólo econômico e político mais forte, as disputas políticas no plano internacional e as dificuldades do mercado mundial.
É certo que o Mercosul segue existindo como uma forma de organização da exploração capitalista e que, na condução do bloco, predominam os interesses dos grandes grupos econômicos capitalistas, em especial os interesses das grandes empresas brasileiras, de diversos setores, incluindo desde as grandes construtoras, a indústria de bens de consumo duráveis e muitos outros. É certo que esta tenha sido a principal motivação do Brasil e seu governo social-liberal para apoiar a entrada da Venezuela, além do reforço das pretensões hegemonistas brasileiras na região.
Mas, ao mesmo tempo, abre-se o espaço para o combate aos golpes de Estado, amplia-se o leque de possibilidades para que governos progressistas, como os da Venezuela, Bolívia e do Equador, possam também se fortalecer para enfrentar as ameaças de boicotes econômicos, intervenções e agressões armadas que caracterizam a política dos EUA para a América Latina. Estando no Mercosul, a Venezuela não mais dependerá comercialmente da Colômbia, um estado terrorista, o maior aliado do imperialismo norte-americano na América do Sul.
A hora é de propor a entrada do Brasil na ALBA, para, fortalecendo-se esta iniciativa, sejam reforçados seus aspectos antiimperialistas e sejam criadas as condições para uma integração soberana de todos os países latinoamericanos, rompendo de vez com o isolamento imposto a Cuba pelos Estados Unidos e apontando para a sua transformação num grande bloco comum latinoamericano. O momento exige a proposição de bandeiras de luta comuns aos trabalhadores de todos os países da região, exige o acirramento da disputa pela hegemonia ideológica e política no plano continental, apontando para a superação do capitalismo.
PCB – Partido Comunista Brasileiro
Comissão Política Nacional
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