A partir de hoje iniciamos a publicação de textos do livro do MDA que, infelizmente, não está sendo divulgado pela mídia comprometida com as multinacionais e, tampouco discutido na universidade brasileira, muito menos nas faculdades de agronomia do Paraná, Rio Grande do Sul e Mato Grosso principais estados que estão plantando soja e milho transgênicos. Eis o primeiro texto:
"Nestes últimos anos, o aumento da área agrícola
plantada com lavouras transgênicas e o número de Plantas Geneticamente Modificadas
(PGM) liberadas comercialmente reforçam a necessidade de estar atento à
evolução do uso das biotecnologias e às suas consequências. O Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA), envolvido em vários domínios desse debate,
propõe, por intermédio do seu Núcleo de Estudos Agrários e de Desenvolvimento Rural
(NEAD), essa publicação intitulada Transgênicos para quem? Agricultura, Ciência
e Sociedade. Trata-se de uma edição sobre questões biológicas e sociais ligadas
à biossegurança do transgênicos, num contexto nacional e internacional, com
autores franceses e brasileiros.
O objetivo deste livro é trazer uma reflexão
acerca da anunciada capacidade dos transgênicos de resolver as dificuldades atuais
e futuras com as quais nossas sociedades e, particulamente, os agricultores
familiares e camponeses do mundo estão confrontados. Ele é também o resultado
das reflexões de certos pesquisadores, até então minoritários, que por meio da
participação e vivência em comissões nacionais de engenharia genética (França)
e em comissões técnicas nacionais de biossegurança (Brasil) não tiveram o poder
de expressar sua oposição e tampouco interromper (em razão do voto sempre
minoritário) as liberações comerciais de sementes transgênicas solicitadas
pelas empresas multinacionais, embora a avaliação do risco e o respeito ao Princípio
da Precaução fossem determinados no Brasil pelas leis nacionais (Lei de
Biossegurança) e internacionais (Protocolo de Cartagena). A discussão se adensa
com enfoques diversos sobre as limitações do reducionismo científico (até mesmo
entre as próprias ciências biológicas), sobre a pertinência e a contribuição Transgênicos
para quem?
Os artigos oferecem, assim, uma grande diversidade
de análises e de pontos de vista de atores sociais: agricultores familiares,
cientistas internacional e nacionalmente reconhecidos, estudantes, associações,
cooperados, ativistas.
Pensamos ser imprescindível relatar a posição da
sociedade civil, tanto no Brasil como em outros países, sobre essa nova tecnologia.
Ela apresenta uma particularidade que não é das menores − cria e transforma
seres vivos. De fato, os movimentos de resistência à aceitação dos transgênicos
pelos consumidores europeus estão abrangendo setores da sociedade cada vez mais
amplos, preocupados com a alimentação e a saúde e apoiados em várias situações,
cuja pertinência não é mais necessário demonstrar, já que os riscos evoluíram
para catástrofes ditas “naturais”... Assim, a sociedade civil manifesta suas preocupações
e organiza-se para pesar sobre as decisões do mundo da ciência.
As inovações são consideradas por numerosas
associações de pesquisadores, cidadãos, grupos de informação, fundações, sindicatos
como devendo ser apropriadas quando trazem benefícios para a sociedade e para a
democracia. Refutam as teses da implicação linear da ciência com a inovação,
desta com a tecnologia e desta, por sua vez, com o progresso. Também defendem
posições críticas em relação às escolhas definidas pelas políticas científicas,
fortemente reduzidas às necessidades da tecnologia e transformadas no que hoje
se desenvolve aceleradamente como tecnociência. Esses grupos reivindicam a
articulação dos saberes científicos e populares entre si, no objetivo de um
enriquecimento recíproco.
Felizmente, o monopólio das discussões sobre a
ciência não pertence exclusivamente aos
adeptos do progresso científico e tecnológico e à tecnociência. Aliás, as
controvérsias científicas sempre fizeram parte da cultura da ciência.
Introdução
Já na década de 1950, Jacques Ellul, filósofo
francês, abordava essa discussão (Le système technicien, Paris: Calman-Levy,
1977): Mais o progresso técnico cresce, mais aumenta a soma de efeitos
imprevisíveis. Certos progressos técnicos criam incertezas permanentes e em
longo prazo [...] Processos irreversíveis foram já implementados,
particularmente no campo do meio ambiente e da saúde. Os problemas ambientais
são exemplares. Criados pelo desenvolvimento tecnológico desenfreado e
irrefletido, necessitam sempre de novos instrumentos e técnicas para resolvê-los.
Os problemas de saúde pública ou de segurança alimentar são sistematicamente
reformulados de modo que possam receber soluções técnicas ao invés de soluções
políticas.
[...] O sistema técnico gera mecanismos de exclusão social devido à
própria Técnica. Ele marginaliza um número crescente de homens e mulheres que
perdem progressivamente a capacidade de se adaptar à sofisticação das técnicas,
de seguir o ritmo do trabalho e da vida social na sociedade tecnicista (L’homme
qui avait presque tout prévu [O homem que havia previsto quase tudo], Paris: Le
Cherche Midi, 1977). Nestes últimos anos, o aumento da área agrícola plantada com
lavouras transgênicas e o número de Plantas Geneticamente Modificadas (PGM)
liberadas comercialmente reforçam a necessidade de estar atento à evolução do uso das biotecnologias e
às suas consequências. O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), envolvido
em vários domínios desse debate, propõe, por intermédio do seu Núcleo de
Estudos Agrários e de Desenvolvimento Rural (NEAD), essa publicação intitulada
Transgênicos para quem? Agricultura, Ciência e Sociedade. Trata-se de uma
edição sobre questões biológicas e sociais ligadas à biossegurança dos transgênicos,
num contexto nacional e internacional, com autores franceses e brasileiros. O objetivo deste livro é trazer uma
reflexão acerca da
anunciada capacidade dos transgênicos de resolver as dificuldades
atuais e futuras com as quais nossas sociedades e, particulamente, os
agricultores familiares e camponeses do mundo estão confrontados. Ele é também o resultado das
reflexões de certos pesquisadores, até então minoritários, que por meio da
participação e vivência em comissões nacionais de engenharia genética (França)
e em comissões técnicas nacionais de biossegurança (Brasil) não tiveram o poder
de expressar sua oposição e tampouco interromper (em razão do voto sempre
minoritário) as liberações comerciais de sementes transgênicas solicitadas
pelas empresas multinacionais, embora a avaliação do risco e o respeito ao Princípio
da Precaução fossem determinados no Brasil pelas leis nacionais (Lei de
Biossegurança) e internacionais (Protocolo de
Cartagena).
A discussão se adensa com enfoques diversos sobre
as limitações do reducionismo científico (até mesmo entre as próprias ciências
biológicas), sobre a pertinência e a contribuição das ciências sociais, humanas
e naturais articuladas e exigidas na abordagem de uma realidade complexa.
Os artigos oferecem, assim, uma grande diversidade de análises e
de pontos de vista de atores sociais: agricultores familiares, cientistas
internacional e nacionalmente reconhecidos, estudantes, associações,
cooperados, ativistas.
Pensamos ser imprescindível relatar a posição da
sociedade civil, tanto no Brasil como em outros países, sobre essa nova tecnologia.
Ela apresenta uma particularidade que não é das menores − cria e transforma
seres vivos. De fato, os movimentos de resistência à aceitação dos transgênicos
pelos consumidores europeus estão abrangendo setores da sociedade cada vez mais
amplos, preocupados com a alimentação e a saúde e apoiados em várias situações,
cuja pertinência não é mais necessário demonstrar, já que os riscos evoluíram
para catástrofes ditas “naturais”... Assim, a sociedade civil manifesta suas
preocupações e organiza-se para pesar sobre as decisões do mundo da ciência.
As inovações são consideradas por numerosas associações de
pesquisadores, cidadãos, grupos de informação, fundações, sindicatos como
devendo ser apropriadas quando trazem benefícios para a sociedade e para a
democracia. Refutam as teses da implicação linear da ciência com a inovação,
desta com a tecnologia e desta, por sua vez, com o progresso. Também defendem
posições críticas em relação às escolhas definidas pelas políticas científicas,
fortemente
reduzidas às necessidades da tecnologia e
transformadas no que hoje se desenvolve
aceleradamente como tecnociência. Esses grupos reivindicam a articulação dos
saberes científicos e populares entre si, no objetivo de um enriquecimento
recíproco.
Felizmente, o monopólio das discussões sobre a
ciência não pertence exclusivamente aos adeptos do progresso científico e
tecnológico e à tecnociência. Aliás, as controvérsias científicas sempre
fizeram parte da cultura da ciência.
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