Consultando meus alfarrábios encontrei algo inédito sobre a Anistia. Muito atual no exato momento em que discutimos a instalação da Comissão da Verdade que está sendo torpedeada pelos “ gorilas” saudosistas do golpe militar. O texto que vocês vão ler foi escrito por Carlos Heitor Cony e publicado na Revista Civilização Brasileira Ano 1 – Março de 1965, página 22, portanto há 47 anos. A intransigência e a intolerância persiste no meio dos defensores da tortura e da morte, infelizmente!
Eis o texto: ANISTIA
“ É preciso que a palavra cresça: invada os muros e as consciências. Desde odia1º de abril que o governo tem diante de si um dilema incontornável: ou processa e condena regularmente os milhares de acusados em todo o País; ou concede anistia. A primeira opção caiu por terra; os processos, em sua maioria, não foram feitos e os poucos que estão em curso pejaram-se de irregularidades e de deformações jurídicas e policiais. Tomemos, por exemplo, o caso do Sr. Juscelino Kubitescheck. Teve ele o seu mandato de senador cassado, os seus direitos políticos suspensos. Onde estão as anunciadas provas de negociatas e crimes de seu governo? Quem – em juízo – acusou o Sr. Juscelino de quê?
No mesmo caso do ex-presidente está a maioria dos suspeitos, dos cassados, dos exilados, até mesmo dos presos. Para a própria moral cristã-ocidental – adotada ostensiva e oficialmente pelos homens do atual governo – a situação imposta aos seus adversários é imoral. Os inquéritos, espalhafatosos em suas origens e deprimentes em suas finalidades, alimentam-se de si mesmos: nada concluem, não absolvem e não condenam nada e ninguém. Não há ordem em todo este cipoal de ignomínia. Para o governo bastou o afastamento de seus adversários, a eliminação sumária e indecente de concorrentes. Qualquer acusação serviu, qualquer tipo de ameaça e de pressão foi útil. Passou-se um ano e em vez de provas o governo insiste em acusar, em ameaçar, em pressionar. Provar – o governo já se convenceu de que é incapaz.
A Nação não aceita tamanha desfiguração. Não somos um aglomerado de idiotas; queremos saber, exigimos conhecer os crimes que foram apenas insinuados. Milhares de brasileiros foram expulsos ou degradados em nome de meras suspeitas e de torpes calunias e prevenções. Quem mata a cobra mostra o pau: o governo nem bem matou a cobra e nem quer mostrar o pau.
Ungido pelas piedosas bênçãos das senhoras da CAMDE, o governo deve ao país e a si mesmo uma explicação: a que vem sendo dada não presta, ninguém – nem mesmo o governo – a aceita. Se é impossível ao governo processar a subversão ou a corrupção alegadas, se faltam provas e modos honestos de o governo regularmente expurgar e punir, resta a segunda opção: a anistia. Que o Congresso vote a anistia, baseado na falta de processos regulares, na falta de critérios e, principalmente, na falta de provas.
Alguns fariseus, notoriamente o Sr. Gustavo Corção, confundem anistia com perdão. Para que um pensamento miúdo consiga penetrar na endurecida cabeça desse reacionário, direi ao Sr. Corção que anistia é invenção grega: perdão é invenção cristã. O grego tornava a culpa inexistente. O cristão a anotava cuidadosamente num caderninho, para posterior chantagem. A idéia do purgatório nasceu desse caderninho. Ninguém está pedindo perdão a este governo. Tal pedido implicaria no reconhecimento de culpa. O que se pede, o que se exige é que, pela ausência de provas provadas, por não ter o Executivo capacidade de presidir a processos regulares, nem ter moral para condenar ninguém, conceda o Congresso a anistia total, sem restrições, sem barganha.
Repito: anistia não é barganha. E terá de vir, mais cedo ou mais tarde, por injunções internas ou por pressões externas do próprio imperialismo internacional. O endurecimento da ditadura de Baptista custou caro a determinados grupos. O erro de Cuba – diz o Departamento de Estado – não mais será repetido. Por tudo isso, que a anistia venha já. E por bem, e para o bem.”
Valeu Cony! Será que ainda assinas esse documento?
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