quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

O FIM DA GUERRA FRIA?


 

A Guerra Fria acabou

Amy Goodman(*)

A política sem êxito dos Estados Unidos contra Cuba, que fechou por mais de meio século, as relações entre estes países vizinhos e infligiu danos a várias gerações do povo cubano,  poderia finalmente estar chegando ao fim. Alan Gross, um empreiteiro do governo norte-americano condenado em Cuba por espionagem, foi libertado depois de cinco anos de prisão. Outra pessoa, não identificada, presa em Cuba há vinte anos por espionar para os Estados Unidos, também foi libertada. Este acontecimento foi manchete em todo o mundo. Não tão bem explicado na mídia norte-americana foi a libertação de três prisioneiros cubanos nos Estados Unidos. Os três membros do Cinco de Cuba que ainda estavam presos. Os Cinco foram presos no final de 1990 sob a acusação de espionagem, mas eles não estavam espionando o governo dos EUA. Eles estavam em Miami, a fim de se infiltrar nos grupos paramilitares cubano-americanos ali instalados, com a finalidade  de fazer a destituição  violenta do governo cubano.

 O presidente Barack Obama ao anunciar oficialmente a noticia disse que “ esta não é uma simples troca de prisioneiros. Hoje, os Estados Unidos está mudando a sua relação com o povo de Cuba. Estamos produzindo as mudanças mais significativas da nossa política em relação a Cuba, em mais de 50 anos. Vamos terminar a abordagem ultrapassada que durante décadas não conseguiu promover nossos interesses e, em vez disso, começar a normalizar as relações entre os nossos dois países. Através destas mudanças, temos a intenção de criar mais oportunidades para o povo americano e ao povo cubano e iniciar um novo capítulo entre os países das Américas. Instruí o secretário [de Estado John] Kerry para começar imediatamente o diálogo com Cuba para restabelecer as relações diplomáticas que foram interrompidas em janeiro de 1961 ".

Foi o Presidente Dwight Eisenhower, quem rompeu relações com Cuba em 3 de janeiro de 1961, dois anos após Fidel Castro tomar o poder. Mais tarde, o presidente John F. Kennedy estendeu o bloqueio. Poucos meses depois de Kennedy tomar posse, houve a invasão CIA na Baía dos Porcos, com a intenção de derrubar o governo de Fidel Castro, teve um resultado desastroso. É universalmente considerada como um dos maiores fiascos militares da era moderna. Dezenas de pessoas foram mortas e mais de 1200 mercenários da CIA foram presos em Cuba.

Cuba tornou-se uma zona quente, especialmente quando a União Soviética tentou colocar mísseis nucleares de curto alcance na ilha, o que precipitou a chamada Crise dos Mísseis em outubro de 1962. Este episódio foi amplamente considerado como o mais próximo que têm estado essas duas potências mundiais em envolver-se numa guerra nuclear. Os Estados Unidos também tentou assassinar Fidel Castro. Enquanto um  Comitê do Senado dos Estados Unidos identificou oito tentativas desse tipo, Fabián Escalante, ex-chefe da contra-espionagem cubana, descobriu pelo menos 638 tentativas de assassinato.

A Revolução Cubana tem seus detratores, mas a transformação da vida cotidiana alí não pode ser negada. Ao longo da década de 1950, durante o governo do ditador Fulgencio Batista, a maioria dos cubanos sofreram extrema pobreza, com pouco acesso a educação, saúde e empregos bem remunerados. O regime de Batista foi brutal, com prisões arbitrárias, torturas e execuções. Batista aliou-se com a máfia americana, se beneficiando pessoalmente da corrupção generalizada, especialmente dos suntuosos hotéis e cassinos de Havana. Atualmente, os cubanos desfrutam da mesma expectativa de vida que os seus vizinhos dos EUA e tem a mais baixa  taxa de mortalidade infantil . Cuba tem uma das mais altas taxas de alfabetização do mundo, superada apenas pela Finlândia, Dinamarca, Nova Zelândia e Austrália, de acordo com o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, o que coloca os EUA em 21º lugar no ranking mundial, dois níveis sobre o Cazaquistão. Cuba, frequentemente atingida por furacões, desenvolveu um dos melhores sistemas de saúde de resposta aos desastres naturais em todo o mundo. Recentemente enviou 250 médicos à África Ocidental para combater o Ébola. No ano de 2005, o então presidente Fidel Castro se ofereceu enviar  1500 médicos aos EUA  após o furacão Katrina.

O governo de  George W. Bush nunca respondeu.

O bloqueio tem sido por muito tempo a política eleitoral dos EUA, já que  a comunidade cubana em Miami, boa parte da qual é histórico e resolutamente anti-castrista, foi considerada crucial para ganhar o estado da Flórida, numa eleição presidencial.

Miami também serviu como um refúgio para os grupos terroristas anti-castristas.

Em 1976, um ataque terrorista explodiu um avião da Aviação Cubana. O avião explodiu no ar e as 73 pessoas a bordo morreram instantaneamente. Em 1997, uma série de atentados em hotéis de Havana causou a morte de um turista italiano. O ex-agente da CIA Luis Posada Carriles reconheceu seu envolvimento nos atentados em hotéis e há evidências ligando-o fortemente com  o bombardeio do avião. Os Cinco de Cuba foram condenados por investigar as atividades terroristas destes homens e grupos sem fins lucrativos que lhes serviam de apoio, como a Fundação Nacional Cubano-Americana e Irmãos para o Resgate. Posada Carriles vive atualmente na Flórida como um homem livre.

A Guerra Fria acabou. O governo de Cuba é comunista, assim também o são os governos da China e do Vietname, com o qual os Estados Unidos mantêm fortes laços. Os onze milhões de cidadãos de Cuba, e todos os que vivem aqui, nos EUA, merecem um vínculo fluido e aberto como vizinhos, na base da igualdade e enraizada na paz.

(*)Amy Goodman: Democracy Now.

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